Financiamento eleitoral e prestação de contas foram temas do Enfoque, mais um evento da programação do VII Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral (CBDE), realizado na noite desta quarta-feira (19). Participaram os advogados Carla Karpstein e Flávio Pansieri, com a condução de Humberto Borges Chaves Filho.
Carla lembrou que financiamento é essencial no processo eleitoral, mas acaba ficando em segundo plano nos debates. “O tema financiamento sempre será o destaque principal, porque é dali que vem o caixa 2, que resulta em cassação de mandatos, é do financiamento que temos pelo menos a maneira mais clara de se demonstrar quais são os doadores e onde o candidato tem sua base”, ressaltou Carla.
A advogada observou que, mesmo com vaquinhas eletrônicas e com opções tecnológicas modernas para que pessoa física participem como doadoras, ainda se tem procurado alternativas para a vedação do financiamento privado, especialmente o uso de recursos públicos.
“Muita gente é contra porque entende que o dinheiro público não deve ser usado para financiar campanhas. Por outro lado, há os que consideram que o processo seria mais justo e democrático, porque não depende do financiamento privado e não beneficia os candidatos que têm mais vantagem financeira” disse Carla ao resumir o contexto.
Ela procurou demonstrar que, apesar da defesa de que o financiamento público é mais democrático, na prática, isso não ocorre, pois a distribuição de recursos está atrelada à lógica dos partidos. “O nosso sistema é construído em cima da força e da autonomia partidária. E os partidos têm perfil de direito privado e uma forma de agir como melhor entenderem. O comando do diretório nacional determina para onde esse dinheiro vai”, descreve. Em 2020, os três partidos que mais vão receber valores do Fundo Especial são PT, MDB e PSL, que devem totalizar cerca de R$ 600 milhões.
Financiamento privado
“Sou favorável ao financiamento de pessoas jurídicas, entendo que o poder econômico é um dos fatores reais de poder relevantes e que deve ser levado em conta no processo da democracia”, afirmou Pansieri, citando Konrad Hesse, que defendia essa visão ao dizer que a constituição por todos os fatores reais de poder é o que legitima o processo eleitoral.
O advogado também respondeu a uma pergunta de Chaves sobre como afastar a influência do poder econômico. “Me parece um equívoco, talvez um mundo Pollyana, que alguns dos atores políticos pretendam imaginar um mundo ideal, onde não existam interesses, ou onde o lobby não seja aceitável ou não seja uma prática cotidiana na realidade brasileira”, pontuou Pansieri. Ele observou que hoje as pessoas têm medo de doar para campanhas e que isso se tornou quase uma prática criminosa. “O registro dessas doações é o caminho para a lisura do processo”, sintetizou.
Para Pansieri, é preciso levar em consideração que não se pode controlar a intenção das pessoas. “Não podemos imaginar que é possível controlar a essência dos indivíduos. Cada um de nós é construído por uma série de valores, interesses e impulso que nos levam a atuar em sociedade, a financiar campanhas ou grupos de pressão. E é impossível afastar isso”, ponderou.
Candidatura feminina
Carla lembrou que o STF e o TSE em julgamentos concluídos já determinaram que se 30% das candidaturas são femininas, elas têm de receber 30% dos recursos de campanha. Contudo, com a pandemia, em uma realidade na qual as mulheres assumem 80% das tarefas de casa, com home office e supervisão homeschooling, a participação feminina terá desafios a mais. “Isso inibe e dificulta a participação feminina no processo eleitoral. Só no próximo congresso, às vésperas de outra campanha, veremos um efeito dessa determinação em relação aos recursos para as candidaturas femininas”, apostou Carla.