Para a ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia, a administração pública brasileira não tem excesso de servidores, o problema é a distribuição e, na visão dela, aqueles que trabalham em serviços essenciais devem ser mais valorizados. “A administração pública brasileira não tem um excesso de pessoas como se diz, mas uma má distribuição. Se temos um problema com educação, é esse servidor que temos que valorizar. Se temos problema com saúde, é esse trabalhador que precisamos valorizar.” A ministra fez a declaração durante a conferência Democracia, Constituição e Administração Pública, no VII Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral (CBDE).
Também participaram a presidente do Instituto Paranaense de Direito Eleitoral (Iprade), Ana Carolina Clève e o presidente do congresso, Luiz Fernando Pereira.
“Pensar para o bem servir o público demanda uma transformação e não uma reforma da administração. Os princípios da constituição são os que exatamente precisam ser cumpridos”, opinou a ministra do Supremo. Para ela, a maior preocupação do administrador público deve ser com a eficiência, cuja falta resulta na insatisfação da sociedade que, em casos extremos, desemboca em manifestações de ódio.
A ministra também fez um panorama sobre experiência democrática em diferentes contextos. “Não há alternativa que o ser humano tenha pensado à democracia. Para problemas com a democracia, mais democracia”, afirmou. “A democracia é desenhada de maneira diferente em cada estado porque é desenhada conforme cada povo pensa. O que está na base é o valor Justiça”, acrescentou a ministra.
Cármen Lúcia também falou sobre o crescente comportamento de intolerância daqueles que veem como inimigo quem pensa diferente e como isso é antidemocrático. “O momento que vivemos deixa à mostra muita intolerância, até mesmo com os princípios constitucionais. Mas isso é um soluço histórico, que será superado”, avaliou. “A liberdade não pode ser garantida se não no espaço democrático. O pluralismo tem de ser algo que nos aproxime e não que nos distancie”, pontuou a integrante do STF.
Desigualdade
A efetivação dos princípios constitucionais foi outro ponto de destaque, especialmente a igualdade. “Não se pode falar de democracia efetiva quando não há igualdade. Este é o mais repetido na Constituição, porque o constitucionalista encontrou o maior problema, que é a desigualdade. E vemos isso pelo preconceito contra mulheres, negros, indígenas e outras minorias”, refletiu a ministra.
Sobre o contexto da pandemia, ela citou as pessoas em situação de mais vulnerabilidade. “Distanciamento é ruim para todos. Mas é pior para quem não tem onde morar ou mora em um lugar muito pequeno, com seis ou oito pessoas, onde um distanciamento é inviável”, lamentou.
A necessidade de os cidadãos se engajarem também foi citada pela magistrada como fundamental para consolidar o ordenamento constitucional. “A Constituição não é folha de papel e não se concretiza na promulgação, mas na efetivação que cada cidadão faz de seus direitos”, enfatizou. “Quanto mais o cidadão for responsável pelos direitos e tomar para si, de maneira socialmente eficaz, que o direito posto se transforme na vida dele, mais igualdade teremos”, acrescentou. Para a ministra, as dificuldades do sistema democrático do país são superáveis. “As dores do Brasil não são maiores do que os ideais do Brasil”, disse Cármen Lúcia.
Mulheres no poder
Ao fazer interlocução com a ministra, Ana Carolina lembrou que é a primeira mulher a presidir o Iprade e destacou que, para ela, é muito importante contar com a presença de uma mulher que ocupa um espaço de poder, como a ministra Cármen Lúcia.
A ministra também destacou a importância de haver uma mulher à frente do Iprade. “Ter a doutora Ana Carolina como a primeira mulher presidente do Iprade é uma honra enorme para nós mulheres. Mas também precisamos lembrar que participar é ser responsável e saber que há ônus no exercício do cargo”, afirmou Cármen Lúcia.
Na oportunidade, Ana Carolina também homenageou as servidoras Noriko Tsukamoto e Roberta Gresta, que ajudaram a organização do Congresso a conceber uma programação voltada para ao as pessoas que trabalham no Judiciário. “Quando pensamos em democracia, não podemos só pensar no plano abstrato, mas temos que pensar em todos aqueles que fazem a máquina funcionar, como os servidores”, disse a presidente do Iprade.