ENFOQUE – FINANCIAMENTO E PRESTAÇÃO DE CONTAS

Público ou privado, o financiamento eleitoral é imprescindível para a manutenção do sistema democrático. Como construir um modelo adequado à realidade brasileira?

 

Humberto Borges Chaves Filho | Carla Karpstein | Flávio Pansieri

A advogada Carla Karpstein iniciou as discussões apontando como a temática do financiamento eleitoral é normalmente colocada em segundo plano nas análises acadêmicas diante de temas de maior destaque, como o abuso de poder.  Tratou inicialmente da importância do financiamento privado de campanhas, cada vez menos significativo na realidade brasileira. Apontou quequanto maior a eleição, menor é a participação das pessoas físicas”, apesar da importância dessa participação no financiamento das campanhas como forma de estreitamento dos laços entre eleitor e candidato.

A debatedora afirmou que o primeiro passo para a evolução nesse aspecto perpassa pela superação do que ela entende ser uma hipocrisia atinente à forma como a sociedade brasileira compreende a relação entre financiamento privado e democracia, ainda tratada como um tabu. Nesse ponto, apontou ainda a  realidade dos Estados Unidos, em que o dinheiro se faz muito mais presente no processo decisório por meio do financiamento direto realizado por grupos que defendem determinados interesses e decidem promover candidaturas próprias, sem que isso gere o nível de desconfiança atualmente existente na sociedade brasileira.

Por outro lado, o modelo de financiamento público de campanhas também não passa ileso pela crítica popular. Nesse sentido, a expositora traz para o centro da discussão a autonomia partidária na distribuição dos recursos, a partir da análise dos critérios já definidos por alguns partidos que disputarão as eleições de 2020. Nesse ponto, aponta que partidos como o MDB optaram pela adoção dos critérios de viabilidade política, conferindo a deputados e senadores a atribuição de distribuição dos recursos. Outros, como o PDT, adotaram um critério de alinhamento partidário, com avaliação do histórico do candidato.

Ressaltou, por fim, que o tema do financiamento eleitoral parece que sempre será o destaque principal das eleições, uma vez que a partir dele é possível demonstrar a base política sobre a qual se constrói determinada candidatura, bem como é possível aferir a prática de ilícitos, como o de Caixa 2.

Em seguida, o professor Flávio Pansieri iniciou a sua exposição afirmando ser favorável ao financiamento eleitoral por pessoas jurídicas no Brasil, ao considerar que o poder econômico precisa ser levado em conta nas democracias. Assim, partiu para a análise do voto de alguns dos ministros do STF na decisão que vedou tal modalidade de financiamento, iniciando pelo do relator, Ministro Luiz Fux, que buscou delimitar um espaço restrito de atuação pública que tem como único legitimado a pessoa física.

Outrossim, quanto aos argumentos de que a inconstitucionalidade da doação por pessoas jurídicas decorre de uma aproximação da vedação constitucional à doação por ONGs e associações sem fins lucrativos, afirmou que, na verdade, o mais adequado seria a análise da constitucionalidade daquele dispositivo, que, em sua ótica, oferece uma vedação indevida. Também ponderou, quanto à interpretação do art. 14 §9º da Constituição Federal, evocada pelo min. Dias Toffoli, que a mencionada interferência que se busca coibir não se demonstra pela simples utilização do financiamento por pessoas jurídicas, interpretação que também se coaduna com o voto do min. Teori Zavascki.

Ademais, após questionamento, a professora Carla Karpstein afirmou que acredita que deve haver um incremento financeiro nas campanhas femininas no pleito de 2020 como decorrência do fim das coligações proporcionais, que vai aumentar a exigência sobre os partidos políticos. Pontuou também que devem ser sentidos nas eleições do corrente ano os efeitos do acúmulo de funções das mulheres nesse momento, aspecto que inibe e dificulta a participação política feminina.

Instado a se manifestar sobre os mecanismos postos para afastamento da influência do poder econômico no poder político, o professor Flávio Pansieri afirmou que “é um equívoco pretender imaginar um ambiente político onde não existam jogos de interesses ou, ainda, onde o lobby não seja uma prática cotidiana. Atualmente, completou, “as pessoas físicas têm medo de doar. Doar para campanhas tornou-se uma prática quase criminosa”. Segundo o convidado, finalmente, é preciso frisar que o que garante a lisura de um processo eleitoral é o registro das doações, tanto que grandes operações para elucidação de crimes mostraram que “o caminho das pedras se deu nas prestações de contas de partidos”. Nesse sentido, deve-se admitir que é impossível controlar a essência dos indivíduos, na medida em que são compostos por impulsos e interesses que, ao fim e ao cabo, levam-nos a apoiar determinadas ideias ou partidos.

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ENFOQUE – O SISTEMA ELEITORAL É INCLUSIVO? PARTICIPAÇÃO POLÍTICA, REPRESENTATIVIDADE E INCLUSÃO

 

Luiz Magno Pinto Bastos Júnior | Cristina Neves | Juliana Freitas | Claudia Werneck

Cristina Neves iniciou falando sobre o princípio da igualdade de oportunidades, que é basilar no direito eleitoral e que se traduz em dois tipos de igualdade, formal e material. Citando Aristóteles, aduziu que a igualdade é “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades”. Afirmou que no Direito Eleitoral, considerando a necessidade de representatividade na política, é preciso fazer essa separação e proporcionar a igualdade material aos diversos perfis de cidadão, com o intuito de que não se tenha somente eleitores com perfis variados, mas também eleitos.

A debatedora afirmou que para que sejam superadas as discrepâncias, é necessário identificá-las e enfrentá-las. Analisando a questão de gênero, citou que a divisão sexual do trabalho, que atribui às mulheres piores condições no mercado e lhes confere papel primordial na vida doméstica, pode interferir consideravelmente nas eleições, principalmente nas próximas, em decorrência da pandemia que agravou esse cenário.

Cristina citou ainda a desigualdade estrutural existente no Brasil, não só quanto ao gênero, mas também quanto à raça e à sexualidade, ao considerar que nem os negros nem a população LGBTQI+ têm lugar de importância nos cargos eletivos e cúpulas partidárias. Sendo o Brasil o país que mais mata homossexuais e transgêneros e com o racismo estrutural e institucionalmente perpetuado, constitui-se um sistema igualmente desigual. Falou, também, que a limitação da renda impede a ascensão política e a participação do poder público, de forma a agravar o cenário de privilégios que se verifica. O sistema é desigual porque a sociedade também é, disse a debatedora.

Afirmou que a democracia é uma obra em construção. Cabe a todos, inclusive por meio do sistema eleitoral, promover uma dinâmica política mais inclusiva. Ela reconhece que sido conferida, de fato, uma atenção especial às questões de gênero, e as determinações do sistema eleitoral quanto ao tema têm ajudado a criar um ambiente mais inclusivo. Entretanto, ressaltou, que em relação as demais desigualdades não é dada a atenção devida. A inclusão é necessária para que sejam trazidos problemas alheios às nossas realidades.

Concluiu refletindo que, ao mesmo tempo em que o sistema eleitoral é reflete a sociedade desigual em que está inserido, ele pode ser uma estrutura de mudança, contribuindo para a alteração das dinâmicas sociais a partir da inclusão de grupos vulneráveis na vida política do país e na construção de políticas públicas pensadas a partir das vulnerabilidades existentes.

Juliana Freitas iniciou provocando a seguinte reflexão: o sistema eleitoral é inclusivo? Para a palestrante, no que toca às mulheres, não. Justificou afirmando que o sistema foi concebido a partir de uma perspectiva androcêntrica, em que a figura masculina era a única referência, sendo o sujeito masculino o único a ocupar espaços públicos.

A palestrante afirmou que essa dinâmica é contrária aos princípios basilares do Estado brasileiro, que traz em seu bojo principal a garantia das igualdades, afastadas todas as discriminações. Além disso, o próprio desenvolvimento social depende da inclusão dos grupos minoritários na dinâmica política do país, o que também é assegurado e previsto constitucionalmente. Não existe desenvolvimento sem inclusão e com violação aos direitos fundamentais dos grupos vulneráveis e isso, infelizmente, ainda está estruturado na sociedade em que vivemos.

Juliana Freitas falou também da Resolução nº 01/2020 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que dispõe sobre as medidas a serem tomadas pelos Estados nacionais a fim de prezar pela integridade e direitos dos grupos mais vulneráveis. Listou, entre elas, as recomendações de que os Estados: nos comitês e grupos criados para o enfrentamento da COVID, assegurem participação feminina; proponham medidas surgidas sempre levando em consideração a perspectiva de gênero; estabeleçam canais alternativos de denúncia de violências, principalmente doméstica; e que se mantenha a oferta de educação sexual.

A expositora afirmou que, em momentos de crise, a vulnerabilidade dos setores marginalizados se agrava. Infelizmente, o Brasil não tem observado as medidas divulgadas pela Comissão, o que pode ter gravosos impactos sociais, inclusive nas eleições municipais de 2020, uma vez que a vida doméstica de inúmeras mulheres pode interferir em suas participações nos processos político-eleitorais. Alertou também que a omissão estatal pode custar às minorias, não somente efeitos problemáticos das mais diversas ordens, mas também suas próprias vidas.

Finalizou afirmando que a determinação de participação mínima de mulheres nas cúpulas dos partidos não acarreta prejuízo à autonomia partidária, uma vez que a própria ordem constitucional impõe a todos, principalmente aos partidos políticos, a observância dos princípios fundamentais do Estado. Dessa forma, considerando os princípios da igualdade, democracia, bem como reconhecendo que o desenvolvimento só se dá pela inclusão e observância dos direitos humanos, é preciso que as dinâmicas partidárias aconteçam de forma representativa.

Ao assumir a fala, Claudia Werneck, aduz que o sistema eleitoral brasileiro, apesar de ainda bastante excludente, é mais avançado em relação às pessoas com deficiência se comparado com outros países da América Latina.

Entende que esse avanço ainda é pouco diante de séculos de exclusão desses grupos. Afirma que a discriminação é um ônus para o Estado e para o povo, e que nenhum sistema eleitoral será totalmente acessível se não estiver aberto à todas as expressões de valor humano.

Fala que atualmente vivemos a maior exclusão de pessoas com deficiência da história, e que isso se tornou um problema ainda maior a partir do aumento das práticas virtuais decorrentes da pandemia, o que diminuiu a acessibilidade de muitas pessoas, principalmente das que já enfrentavam dificuldades, a exemplo das pessoas com deficiência.

Quando questionada sobre a incorporação da inclusão no sistema político Claudia Werneck aduz que se deve exercitar, para além da política, a confluência de modos de pensar sem escolher causas e dilemas de grupos específicos.

Finalizou dizendo: “A gente segue valorizando mais o voto do que a pessoa que vota”.

As palestrantes foram questionadas se poderia haver um agravamento do atual quadro de exclusão decorrentes da escolha por um sistema de lista fechada ou majoritária por distritos. Cristina Neves acredita que a lista fechada e o sistema distrital melhoram a representatividade, mas que seria difícil conseguir acomodar todas as pautas nestes sistemas devido ao amplo universo de grupos e pautas. Juliana Freitas entende que é necessária uma fase de educação política no Brasil, pois não se discute a inserção da sociedade no processo de transformação eleitoral, limitando-se a mudanças na legislação. Entende ser difícil agregar todos os grupos minoritários no sistema de lista fechada, e conclui que a política é a própria sociedade viva nesse processo de transformação.

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ARENA TALKS – PROMOÇÃO DO GESTOR PÚBLICO NO COMBATE AOS EFEITOS SOCIAIS DA COVID: POSICIONAMENTOS ATUAIS E FUTUROS DOS TRIBUNAIS

 

Vanessa Volpi | Luiz Carlos dos Santos Gonçalves | Gabriela Rollemberg

Nesta quarta (19), o VII CBDE promoveu um importante debate sobre os contornos da promoção do gestor público no combate aos efeitos sociais da COVID19. O painel foi mediado pela advogada, Vanessa Volpi e contou com a participação do Procurador da República, Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, e da Secretária-Geral da ABRADEP, Gabriela Rollemberg.

O ex-Procurador Regional Eleitoral de São Paulo iniciou sua fala destacando a importância do direito à informação, ainda mais no contexto da pandemia, que gera a necessidade de a administração pública informar adequadamente as medidas adotadas. Neste cenário, o debatedor destacou sua preocupação com os abusos que podem levar ao proselitismo político com a entrega de benefícios sociais que são custeados pelos contribuintes. Por isso, salientou que a Lei das Eleições destaca no art. 73 as condutas vedadas que buscam limitar abusos pelas candidaturas, principalmente no que se refere às reeleições. O palestrante destacou que não é fácil ser oposição no Brasil.

O último ponto abordado em sua fala inicial foi sobre o resguardo da Lei das Eleições em relação à proibição da doação de bens no período eleitoral, excepcionando as calamidades públicas e permitindo que o Ministério Público acompanhe neste período a execução financeira e orçamentária. Ao final, salientou que os gastos com publicidade institucional devem ser proporcionais ao valor gasto com o benefício social.

A advogada Gabriela Rollemberg iniciou sua exposição destacando que, ao contrário do que narra o debatedor anterior, há uma dificuldade em ser gestão. No que se refere à propaganda institucional, descreveu o cenário de insegurança do gestor, tendo em vista as diversas lacunas expostas pela legislação eleitoral e que dificultam a tomada de decisão.

Sobre a pandemia, tem-se que há um dever legal em assistir à população, levando a necessidade de observância do princípio da proporcionalidade no pleito eleitoral. Por isso, defende que a propaganda pode ser utilizada para que a população tenha conhecimento do benefício que lhe é oferecido e como ter acesso.

Após as exposições iniciais, alguns questionamentos foram direcionados aos palestrantes. Ao ser perguntado sobre a divulgação da publicidade institucional nas redes sociais do agente público, o Procurador da República respondeu que essa conduta pode caracterizar abuso, à medida em que não é possível separar a figura do administrador e do candidato, o que torna a vedação legal extensiva aos perfis pessoais. Por fim, salientou que “nem toda restrição tem natureza de censura”.

Outro questionamento foi direcionado à advogada Gabriela Rollemberg e tratou da exigência jurisprudencial que determina a suspensão de todo o conteúdo publicado nos perfis institucionais, bem como a ausência de parâmetros sobre quais publicações devem permanecer nas redes sociais oficiais. Na sua resposta, a advogada salientou que ainda existe muita insegurança quando se trata de condutas vedadas, o que torna essencial a criação de um marco regulatório sobre o tema.

Em relação ao conteúdo publicado nas redes sociais oficiais da administração pública, destacou que não existem parâmetros pré-fixados, o que leva muitas vezes à suspensão da página para evitar questionamentos. Por Fim, no que diz respeito às redes sociais privadas dos administradores, salientou que é preciso cautela em relação às restrições para que não haja censura, bem como não privilegie a crítica, sem possibilidade de o gestor público defender a sua gestão.

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Presidente do Instituto Paranaense de Direito Eleitoral: Ana Carolina de Camargo Clève

Presidente do VII Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral: Luiz Fernando Casagrande Pereira

Diretor de Relatoria e Comissários: Paulo Henrique Golambiuk

Equipe de Relatoria: Amanda Helena Aciari de Araujo, Beatriz Alves de Lima Morais, Franklin Sóstenes Soares Alcantara, Giovana de Moraes Busnello dos Santos, Jessica Mayara Bimbatti, Lucas Anderson Cabral da Costa, Marina Fracaro, Matheus Rocha Campos de Souza Neto, Márcio Augustus Barbosa Leite Timótheo, Maurício Tavares Fernandes, Nahomi Helena de Santana, Paola Sayuri Mena Oliveira, Rafaela Farracha Labatut Pereira, Raniella Ferreira Leal, Renan Ribeiro, Salisia Menezes Peixoto, Sthephany Patrício, Victor de Gois Saretti, Victor Rocha Costa, Willian Michel Dissenha

Equipe de Comissários: Emma Roberta Palú Bueno, Geovane Couto da Silveira, Guilherme de Abreu e Silva, Luiz Paulo Muller Franqui, Maitê Chaves Nakad Marrez, Rafaele Balbinotte Wincardt, Roberta Guimarães, Tainara Prado Laber, Wagner Luiz ZaclikevisWaldir Franco Félix Júnior

Diretor de Comunicação: Luiz André Velasques

Diretora de Comunicação: Laura Hofmann Weiss 

Equipe de Comunicação e Mídias Sociais: Ana Paula Rusycki, Caroline Alberini Campitelli, Carlos Eduardo Araújo, Juliana Dal’Bó, Matheus Carvalho dos Santos, Manuela Gonçalves, Nicole Wibe Silva