A relação entre os fundos partidário e eleitoral pautou o último debate do VI Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral. Os ministros Admar Gonzaga e Sérgio Banhos, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e o advogado Eugênio Aragão se propuseram a responder, com a mediação do advogado Thiago Bovério, às seguintes questões: Até onde vai a autonomia dos partidos? Pode a Justiça Eleitoral exercer algum controle na distribuição do dinheiro de campanha?

“A Justiça Eleitoral e o Supremo Tribunal Federal (STF) têm de ser cuidadosos no controle da distribuição de recursos. As consequências precisam ser bem medidas. Há 11 anos o STF flexibilizou a cláusula de desempenho e isso abriu a porta para uma profusão de partidos. As decisões têm efeitos de longo prazo”, considerou.

A norma, lembrou, determina que 5% do Fundo Partidário são distribuídos equitativamente para todos os partidos, mas 95% seguem a proporção dos votos da última eleição geral para a Câmara dos Deputados. “Um dirigente partidário com visão de futuro mira nos estados mais populosos. É uma má notícia para quem vive nas regiões mais remotas”, avaliou, fechando sua apresentação inicial com a avaliação de que a interferência da Justiça Eleitoral na autonomia dos partidos quanto ao uso de recursos deve ser mínima.

Diálogo

O ministro Sérgio Banhos considerou, a respeito do tema, que é imprescindível um diálogo entre os poderes. “É sempre saudável questionar os limites e discutir os papéis inerentes a cada poder. O que parece incontroverso é que a omissão legislativa pode gerar dúvidas. Por outro lado, a ultrapassagem do papel da Justiça Eleitoral traz riscos”, destacou. Banhos avaliou ainda que o espaço de debate por excelência é o Legislativo. “Ao Judiciário cabe garantir os direitos fundamentais com o que chamo de ´modéstia judicial´”, afirmou.

Banhos lamentou a falta de uma reforma política mais ampla e atribuiu a essa lacuna a baixa participação feminina na política. “O Brasil é o 154º país no ranking das mulheres na política. Elas são pouco mais de 10%. A reforma eleitoral de 2017 não trouxe a esperada igualdade de gênero na política.” Banhos lamentou o que classificou como candidaturas fantasmas, resultado do cumprimento protocolar da lei, sem que os partidos promovam as candidaturas femininas de fato.

Hipertrofia

Boa parte dos problemas da vida pública hoje se deve à hipertrofia do Judiciário. “A normalidade depende de que possamos garantir um certo equilíbrio”, defendeu Aragão, para quem as fragilidades do sistema político-partidário colocam o país em um dilema. “Devemos deixar o barco correr ou interferir de forma coercitiva para colocar as coisas no lugar? Essa dúvida está presente também quando se discute o limite da interferência no uso dos recursos pelos partidos”, pontuou.

De acordo com Aragão, a falta de democracia intrapartidária e a má qualidade da maioria das siglas são aspectos a serem levados em conta nesse debate. “Temos partidos que por dentro são ocos, que não usam o dinheiro do fundo partidário para sua organização nem para promover a cultura política. Não têm qualquer compromisso com a igualdade de gênero. Tais partidos conchavam, vendem influência e querem prebendas. São poucos os partidos que levam com seriedade a missão de usar o fundo partidário para manter o bom funcionamento do partido”, apontou.