Primeiro diálogo desta quarta-feira no VI CBDE abordou o tema “Ativismo e autocontenção em matéria eleitoral” e teve também as participações de Walber Agra e Clarissa Maia
“Os juízes precisam ter a humildade de saber qual é o seu lugar”. A avaliação é de Néviton Guedes, desembargador do TRF da 1ª Região e doutor em Direito pela Universidade de Coimbra, ao criticar duramente o ativismo judiciário durante o primeiro “Diálogo” do VI Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, que começou na manhã desta quarta-feira (13/06) na Universidade Positivo, em Curitiba.
Para Néviton, uma decisão ativista exige resposta não encontrada e não prevista no Direito, o que causa uma insegurança jurídica no país e coloca o Judiciário num papel de protagonista em decisões cruciais sobre políticas públicas, que constitucionalmente deveriam ser de outros poderes. “Sempre me pareceu que a democracia brasileira perde algo de seu, de sua efetividade, quando nós brasileiros consentimos e admitimos que um juiz saia dos limites em que naturalmente ele deve se situar”, colocou.
Na visão do magistrado, quando um juiz age forma ativista ele toma decisões que fogem à semântica e à sintaxe da norma jurídica e, assim, encontra um significado que ela não representa. “Vivemos em uma sociedade regida sob as normas do Direito, e as pessoas e instituições têm suas obrigações de uma forma ordinária. O Judiciário age extraordinariamente. Numa sociedade em que se aciona o Direito para que todas as suas necessidades sejam cumpridas e seus problemas resolvidos, estamos transformando o extraordinário em ordinário”.
O mais grave, prosseguiu, é que há juízes que estão atuando até quando o suposto obrigado sequer poderia atuar. “Existem inúmeros processos judiciais contra prefeitos ou outros políticos que realizem um gasto sem previsão orçamentaria e sem licitação. Mas, ora, quando o juiz determina a um município a compra de um medicamento de alto custo que sequer está previsto no protocolo do SUS, ele está obrigando o prefeito a realizar uma compra sem previsão orçamentária. É um contrassenso”.
Néviton dividiu os “ativistas” em três tipos: os “convictos”, os “envergonhados” e os “cínicos”. “Os convictos querem ser ativistas e assim se assumem. Os envergonhados agem de forma ativista, mas ficam indignados quando você diz que ele está agindo assim. Só que suas decisões não estão em qualquer norma do Direito, está apenas dentro da cabeça dele. Já o cínico sabe que é ativista, e ainda quer te arrastar junto. E o pior pecador é aquele que quer arrastar o homem bom para o pecado”, brincou.
O advogado paraibano Walber Agra lembrou que o ativismo pressupõe que o magistrado tomou uma decisão baseada não em critérios jurídicos, mas em critérios políticos. “Mas o homem é um ser político”.
Além disso, prosseguiu, esse tipo de decisão precisará ser tomada em todas as vezes que houver um vácuo nas ações do Legislativo ou do Executivo. “Dentro das possibilidades metajurídicas, temos a grande questão: eu posso mitigar o ativismo, mas não posso esquecer o ativismo”, ponderou.
Demonização
Já a advogada piauiense Clarissa Maia avaliou que há uma falta de comprometimento entre a comunidade jurídica para debater esse fenômeno. “Parece que o ativismo só é refletido pelos operadores do Direito após realizado”. Não há um compromisso sério dos magistrados, analisou, ao desenvolver jurisprudências ativistas.
Na visão da jurista, esse fenômeno pode levar a uma “demonização” do poder Juriciário, aos moldes do que já ocorre com a classe política. “As instituições jurídicas vêm se colocando como se fossem o último sopro de republicanismo num estado que está tão comprometido em suas bases democráticas.
O Judiciário é o único referencial de Estado para muitos cidadãos. Há uma forte transferência de esperanças para esta instituição, o que faz com que magistrados se coloquem nesse papel de justiceiros, de salvaguarda. Chama a atenção o ‘ativismo à brasileira’, no qual os magistrados são instigados a debater publicamente cada vez mais os temas da nossa atualidade – sejam politicas, morais, religiosas –, e isso é muito problemático. O Judiciário está querendo participar como ator principal do cenário político. O perigo é que a demonização da política chegue também ao Judiciário, porque existem promessas que não podem ser cumpridas”, finalizou.